
Essa é uma pergunta recorrente nas nossas redes: para entregar projeto executivo de interiores, o que funciona melhor, Book A4 ou prancha? Nós vivemos essa polêmica na prática. Testamos os dois formatos, confrontamos vantagens e limitações, escutamos obra, fornecedores e clientes, e mudamos completamente nossa forma de produzir e entregar. Aqui, compartilhamos nossa experiência real, sem floreio: o que nos levou a trocar o Book A4 pelas pranchas e como isso impactou a execução.
Quando começamos o escritório, o nosso padrão era o book. A referência que tínhamos era essa: onde eu trabalhava se entregava assim, e 99% dos nossos amigos também. Em interiores, era quase um consenso. Em arquitetura, nem tanto. Mas a rotina nos mostrou outra realidade: o que é bonito nem sempre é o que funciona na obra.
Por que começamos com Book A4
A escolha do Book A4 no início foi simples: referência de mercado. Víamos colegas entregando assim e repetimos o modelo. Para quem está montando escritório, a lógica parece boa: imprimir no próprio A4 ou, no máximo, no A3, encadernar, entregar um “livrinho” bonito ao cliente e separar por assuntos para os fornecedores. Parecia organizado.
A gente ainda olha um exemplo antigo aqui no escritório: um book de um projeto executado, fotografado e entregue. Está limpinho. Isso, por si só, diz muito. O projeto executivo existe para guiar a obra. Se o livrinho volta limpo, ele não foi a ferramenta que a obra usou.
Book A4: o que seduz e por que seduz
Antes de falar dos problemas, vamos reconhecer os atrativos do book, porque eles existem e explicam por que tanta gente ainda usa.
Prós do Book A4
Impressão acessível: conseguimos imprimir A4 e até A3 no próprio escritório. Custo ok, zero dependência de gráfica, resultado imediato.
Entrega segmentada: muitos fornecedores pedem os desenhos “separados por tema”. Marcenaria quer só marcenaria, marmoraria quer só pedra. Para orçamento, isso ajuda.
Apelo para o cliente: o cliente gosta do livrinho. A sensação de “produto finalizado” é real. É bonito folhear.
Mas onde o Book A4 começa a falhar
É na obra que o book mostra suas limitações. A rotina expõe o que, no escritório, passa batido. E os problemas se repetiam.
Dificuldade de consulta no canteiro
Em obra, ninguém tem tempo de achar “página tal, item tal”. O ritmo é outro. O que acontecia? Telefone tocando o dia inteiro. “Onde está tal tomada?”, “em que página está a vista da parede?”, “qual é a cota do nicho?”. A informação estava lá, mas escondida em páginas. O formato atrapalhava.
Arquivos pesados e gestão complicada
Outra dor: peso de arquivo. Book soma muitas páginas em um único arquivo. Fica pesado para abrir, lento para editar, caro para armazenar na nuvem e mais sujeito a corromper. Para quem tem volume de projeto, isso escala mal. A infraestrutura do escritório e até a velocidade de trabalho sofrem.
Repetição de legendas e risco de esquecimento
Em book, precisamos repetir legenda em várias páginas, senão a pessoa não vai voltar à página 1 para entender um símbolo da página 20. Repetir aumenta tempo, peso e risco de esquecer algo em uma das páginas. E legenda grande em A4/A3 “rouba” espaço das vistas e das plantas.
Escala limitada e perda de visão geral
Em folha pequena, as plantas e vistas ficam miúdas. A gente passa a dividir o raciocínio em fragmentos. Em vez de ver a parede e tudo que dialoga com ela, a pessoa vê pedacinhos em páginas diferentes. A visão geral se perde, e, com ela, a clareza de execução.
O dia em que a chave virou
A virada veio de quem mais sente o desenho: a obra. Um engenheiro nos disse, com todas as letras: “Está difícil. Eu perco tempo abrindo caderno, procurando informação. Façam um formato grande, para eu colar na parede.”
A primeira reação foi resistência. “Ninguém entrega assim. Por que a gente vai?” É fácil ficar preso à referência. Mas a frase ficou batendo na cabeça. E a prática respondeu: nosso book continuava limpo na obra. Projeto bom é usado. Rasga, suja, leva barro. Se precisa reimprimir, melhor: sinal de que está cumprindo a função.
Quando a informação vai para a parede
Colar prancha na parede muda tudo. O pedreiro com a mão suja de cimento não precisa folhear nada. O pintor com ferramenta na mão consegue ler sem largar o que está segurando. O engenheiro e a equipe olham juntos, apontam, discutem e executam. A informação sai da gaveta e entra no campo de visão de todo mundo.
Sim, precisa escolher um lugar da obra que não terá intervenção imediata. Sim, às vezes mudamos a prancha de parede ao longo do processo. Mas isso vira parte da organização do canteiro. A visibilidade coletiva compensa qualquer logística.
Como reorganizamos o projeto executivo em prancha
Migrar para prancha não é só “ampliar o papel”. Mudamos o raciocínio de representação. Em vez de espalhar assuntos em páginas, passamos a sobrepor o que conversa entre si e aproximar o que precisa ser lido junto.
Sobreposição e proximidade intencional
Elétrica + revestimento + marcenaria: vistas mostram a mesma parede com os elementos que interagem. O armário aparece e, ao lado, a mesma vista sem o armário, revelando o que está por trás e por dentro.
Gesso + iluminação: plantas lado a lado. Quem lê vê o detalhamento do gesso e o detalhamento da iluminação juntos, como acontece na obra, onde um depende do outro.
Plantas e vistas integradas: a pessoa localiza no desenho a parede e, ao lado, já consulta seus detalhes. O “vai e volta” de páginas some.
Pranchas: o que ganhamos na prática
O ganho mais visível foi a clareza. Quando colocamos tudo na parede, a equipe enxerga o projeto. A conversa acontece diante da informação, não no telefone. E isso impacta diretamente o andamento.
Prós das pranchas
Leitura coletiva: várias pessoas consultam ao mesmo tempo, apontam, decidem e executam olhando a mesma base.
Arquivos mais leves: cada prancha é um arquivo de layout separado. Editamos rápido, salvamos rápido e não “arrastamos” o peso do projeto todo.
Menor risco de perda: se der problema em um arquivo, perdemos no máximo uma prancha, não um caderno inteiro.
Legenda enxuta e eficiente: sem precisar repetir a cada página, padronizamos a legenda onde faz sentido e ganhamos espaço para vistas legíveis.
Informação integrada: o que a obra precisa ver junto aparece junto. A leitura fica natural.
Tempo de produção: um apartamento de ~100 m² que levava três semanas em book passou a levar quatro dias em prancha.
Menos erro por esquecimento: ao padronizar a forma de representar, reduzimos os “ah, faltou aquela indicação” que aconteciam no livro.
Os contras das pranchas (e como lidamos)
As pranchas não são perfeitas. Existem contras, e a gente encara de frente.
Custo de impressão
Imprimir prancha costuma ser mais caro. Ou você depende de gráfica, ou investe em impressora grande. Nós não investimos nessa máquina e está tudo bem. Organizamos a rotina com gráfica e seguimos.
Espaço físico na obra
Ocupa parede e, às vezes, mesa. Faz parte do jogo. Escolhemos uma parede estável, com pouca intervenção. Se a obra avança, reposicionamos. A logística existe, mas a vantagem de leitura coletiva pesa mais.
Arquivos, nuvem e fluidez de trabalho
No escritório, separar cada prancha como um arquivo de layout mudou a fluidez. Arquivos menores abrem rápido, atualizam rápido e não congestionam máquinas. Com volume grande de projeto, isso importa — e impacta custo de nuvem, tempo de equipe e até a paciência de quem está produzindo.
E tem o fator segurança: um arquivo gigantesco corrompido dói. Pranchas isoladas limitam o dano. Se algo acontecer, refazemos uma prancha, não o conjunto inteiro.
Book A4: onde ele até ajuda (e onde atrapalha)
Para orçamento, entendemos o pedido do fornecedor: ver só o seu trecho pode ser prático. Mas, para execução, separar demais cria cegueira. O fornecedor perde a noção do que está ao redor, e a obra exige visão do conjunto.
Entregar o livrinho ao cliente é bonito, sim. Mas beleza não guia instalação, não orienta corte de pedra nem posicionamento de ponto elétrico. O que guia é desenho claro, escala legível e informação agrupada de forma lógica.
Como a padronização da legenda nos salvou tempo
Em book, a legenda precisa ser repetida. Em prancha, centralizamos o que é realmente necessário e evitamos redundância. Isso economiza horas ao longo do executivo e diminui a chance de inconsistências entre páginas.
O ganho não é só de minutos economizados; é de confiabilidade. A equipe passa a confiar que a informação está naquele bloco, sempre no mesmo lugar, sempre do mesmo jeito.
O que a obra nos ensinou sobre “projeto bom”
A imagem é forte e verdadeira: o book intacto na obra versus a prancha suja e rasgada. A prancha que volta pedindo reimpressão é a medalha do projeto executivo. Significa que alguém colou, consultou, apontou, errou menos e seguiu com segurança.
A gente sempre explica para o cliente: o papel pode rasgar, pode sujar, e está tudo bem. Melhor imprimir novamente do que ficar um caderno bonito e inútil dentro de uma pasta.
Otimização do projeto executivo: menos volume, mais leitura
Uma dúvida que aparece: “Prancha não vira muita folha?” Pode virar, se você não otimizar. Nosso caminho foi reduzir a multiplicação de pranchas por ambiente ao mínimo necessário, aproximando o que precisa ser visto junto e sobrepondo quando faz sentido.
Isso só foi possível porque mudamos o raciocínio da produção: cada prancha responde a uma pergunta clara da obra. Se a pergunta precisa de duas camadas (com armário e sem armário), elas aparecem lado a lado.
Comunicação na obra: do telefone ao desenho
O telefone diminuiu. Não zerou — obra sempre pergunta —, mas diminuiu muito. Quando a informação está grande na parede, a equipe consulta antes de ligar. A conversa muda de “onde está?” para “vamos conferir se é isso mesmo?”.
Isso libera a gente para fazer o que importa: projetar, revisar, visitar obra para o que é decisivo e não virar “atendimento de página”.
Tempo de produção: o número que não sai da nossa cabeça
Esse dado, para nós, foi decisivo: um apartamento de ~100 m² levava aproximadamente três semanas para gerar o executivo em book. Com pranchas, passamos a produzir em quatro dias. É um salto de eficiência.
E não foi só aqui. Quando ensinamos esse método, a primeira coisa que os alunos relatam é otimização. Menos tempo desenhando, mais tempo pensando o projeto. E menos erro por omissão.
Sobre entregar “o livrinho” ao cliente
A cena é bonita, a gente sabe. Mas projeto executivo não é lembrança, é ferramenta de obra. Se quisermos entregar algo físico ao cliente, há outras formas. A prancha cumpre a função técnica; arquivos digitais cumprem a função de referência. O que não dá é sacrificar clareza de execução por estética de entrega.
Quando a cobrança por “separar por tema” aparece
Recebemos o pedido, claro. Para orçamento, faz sentido. Para obra, explicamos o porquê de a visão completa ser melhor. Normalmente, depois da obra começar, o próprio fornecedor entende o ganho de ter o conjunto na parede e a referência unificada.
Checklist mental que usamos hoje
O que precisa ser visto junto? Juntamos.
O que confunde se estiver longe? Aproximamos.
O que pode ficar em camada? Sobrepomos (com e sem marcenaria, por exemplo).
O que pede visão global? Escala e posição privilegiadas na prancha.
O que vira legenda? Só o essencial, padronizado.
O que diríamos a nós mesmos no início
“Não se prenda à referência só porque todo mundo faz.”
“Escute a obra. Se o desenho não está na parede, algo está faltando.”
Conclusão
A experiência foi clara: o Book A4 agrada no visual e ajuda em orçamento, mas falha quando precisa guiar a execução. A prancha coloca a informação onde ela deve estar: grande, legível e acessível para quem constrói. Ganha a obra, ganha o escritório e ganha o cliente.
Hoje, nosso padrão é prancha. Aprendemos a organizar por sobreposição e proximidade de informação, reduzimos tempo de produção, diminuímos erros e melhoramos a comunicação no canteiro.