Contando Nossos Piores Perrengues de Obra

25 de out. de 2025

Contando Nossos Piores Perrengues de Obra

25 de out. de 2025

Este post

Este post

Este post

Quem trabalha com arquitetura e obras sabe: perrengue é praticamente um item do cronograma. Não importa o quanto você planeje, sempre há aquele imprevisto que vira história para contar — às vezes com dor de cabeça, às vezes com risada no final. Neste post, vamos abrir o jogo e compartilhar alguns dos maiores perrengues de obra que já enfrentamos ao longo da nossa trajetória.

São histórias reais, cheias de aprendizado, e que mostram que errar (ou lidar com erros alheios) faz parte do processo. E claro, tem um toque de humor — afinal, se a gente não rir, a gente chora!

1. O dia em que a obra virou uma piscina

Essa foi logo no começo do escritório, uma daquelas histórias que a gente nunca esquece. Estávamos reformando um apartamento de cerca de 120 m². Tudo lindo no papel: projeto aprovado, cliente animado, equipe pronta para começar. A obra começou com a etapa de demolição, e parecia tudo sob controle… até o empreiteiro acertar um cano de água pressurizada dentro de uma parede.

Foi questão de segundos até o caos começar: jatos d’água, barulho, e o apartamento inteiro alagando. O empreiteiro tentou fechar os registros, mas nada resolvia. A água não parava. E para piorar, o problema não estava nem naquele apartamento — o cano vinha do andar de cima, que estava vazio e trancado. Imagine a cena: água descendo, pedreiros correndo, e o desespero tomando conta.

Eu estava em uma reunião em outra cidade, o empreiteiro em outra obra, e o telefone não parava. No meio da confusão, lembrei da solução mais óbvia e salvadora: “Fecha o registro geral do prédio!”. Quando finalmente fizeram isso, a água cessou — mas o estrago já estava feito.

A água infiltrou para o apartamento de baixo, que também estava em reforma e quase pronto. Armários instalados, marcenaria impecável… e lá estava a infiltração, atrapalhando tudo. O cliente, claro, ficou furioso. Me ligou indignado — e com razão. Fui até o local assim que pude, conversei com o zelador e com a moradora do andar de baixo, me coloquei à disposição para resolver.

Quando cheguei, o cenário não era tão catastrófico quanto parecia. Alguns pingos sobre a ilha de pedra, nada de enchente. Limpei com um pano, gravei um vídeo, mandei pro cliente e segui para resolver o resto. No fim, arrumamos tudo, o projeto ficou lindo, e o cliente até nos contratou de novo para outro trabalho. Mas o aprendizado ficou: verifique tudo, principalmente instalações de construtora — e tenha calma para lidar com o emocional do cliente.

2. O espelho errado (que acabou virando decoração do nosso apartamento)

Outro perrengue clássico envolve um item que parece simples: o espelho. Era um projeto de apartamento, e a obra já estava encaminhada. Tínhamos combinado a instalação de um espelho enorme, do piso ao teto, e para isso o time de vidraçaria foi até lá fazer a medição.

No projeto, o rodapé tinha 10 cm de altura. Mas no meio do processo, o cliente decidiu comprar um rodapé de 5 cm — e esse detalhe não foi comunicado corretamente para quem foi medir o espelho. Resultado: o espelho foi cortado na medida errada, seguindo o projeto antigo. Quando chegou para instalação, faltavam 5 cm para ele encostar no rodapé.

Erro nosso, claro. Tivemos que mandar refazer o espelho, arcando com o custo. Só que aí veio o lado bom da história: o espelho antigo ficou encostado no escritório, até que um dia percebemos que ele encaixava perfeitamente em uma parede do nosso próprio apartamento. Faltaram uns pedacinhos nas laterais, que resolvemos com criatividade — virou quase um mosaico moderno. No fim, o prejuízo se transformou em decoração.

Aprendizado? Não confie no automático — sempre confira medidas e mudanças de fornecedores. O detalhe que parece pequeno é justamente o que mais dá problema.

3. A cortina que cobriu até o sofá (e o custo que sobrou para a gente)

Esse caso foi recente e serviu para reforçar um ponto essencial: atenção ao detalhamento executivo. Estávamos fazendo o projeto de um apartamento com uma sanca iluminada que atravessava toda a parede — passando por uma porta de vidro que dava para a sacada e pela parede do sofá.

No projeto, a cortina deveria cobrir apenas a porta. Atrás do sofá, ficaria um quadro. Mas, na hora de desenhar o executivo, alguém acabou copiando a medida da sanca inteira como se fosse o tamanho da cortina. Ou seja: o fornecedor fez a cortina para toda a parede, de fora a fora.

O resultado: o cliente mandou instalar e perguntou — “Mas essa cortina vai atrás do sofá mesmo?”. Pois é. Tivemos que refazer o pedido e arcar com o custo do ajuste. A cortina ficou quase mil reais mais cara por causa do erro.

Desde então, estabelecemos uma revisão obrigatória: toda medida de cortina, marcenaria e iluminação passa por dupla conferência antes de enviar o projeto. Porque o automático é traiçoeiro, e cada projeto tem suas particularidades.

4. Argamassa + carro = desastre

Esse perrengue é daqueles dignos de filme. Estávamos administrando uma obra em um condomínio que tinha horário restrito para entrada de veículos. A loja não conseguiu entregar o material a tempo e eu precisava levar uns 20 sacos de argamassa pessoalmente — no meu carro, que não era uma caminhonete.

Rebati o banco, enchi o porta-malas e saí voando para o condomínio antes que o portão fechasse. Correndo contra o tempo, acabei não vendo um quebra-mola no caminho. Resultado: passei com tudo e um dos sacos estourou dentro do carro. Virou uma nuvem branca de argamassa, parecia uma cena de comédia. O carro ficou branco por dentro, o cheiro de cimento tomou conta, e o prejuízo foi inevitável.

Entreguei o que deu na obra e ainda passei a noite limpando o carro antes de viajar no dia seguinte. Aprendizado? Não assuma funções que não são suas e não faça nada na correria. O improviso pode custar caro.

5. O rodapé errado (e a importância de revisar o “automático”)

Esse erro aconteceu quando uma funcionária copiou o texto de outro projeto e esqueceu de atualizar. No projeto executivo, constava que o rodapé seria do mesmo material do piso — o que era válido apenas para áreas externas. Só que a casa toda seria com rodapé de poliestireno.

O engenheiro da obra seguiu o projeto à risca e instalou rodapé com o próprio piso na casa inteira. O cliente só percebeu depois, e aí começou a dor de cabeça: tivemos que retirar, reinstalar o rodapé certo e pagar a mão de obra. Por sorte, o cliente tinha piso extra guardado.

Essa história reforça um mantra que repetimos sempre: automatizar é bom, mas revisar é essencial. Cada projeto é único, e não dá para confiar cegamente em templates prontos.

6. O revestimento duplicado (e o estoque que virou outro banheiro)

Esse perrengue foi um misto de susto e sorte. Estávamos acompanhando um cliente que comprou todos os revestimentos em um final de semana — pisos, louças, metais, tudo. O problema foi que, na nossa planilha de metragem, a área dos banheiros estava duplicada.

Quando o pedido chegou à loja, eles separaram praticamente o dobro de revestimento necessário. A entrega foi feita e, dias depois, percebemos o erro: havia material para revestir dois apartamentos inteiros!

Por sorte, tínhamos uma relação muito boa com o fornecedor. Ligamos, explicamos o erro e o gerente foi super compreensivo. Ele recolheu o excedente, pediu para tentarmos usar o restante em outro projeto e resolveu tudo sem custo. Foi um alívio — mas também uma lição.

Conferência dupla em planilhas é obrigatória. Um número errado em uma fórmula pode gerar prejuízo enorme, e o Excel não tem culpa.

7. A geladeira que não entrava na cozinha

Agora sim, a história mais famosa — e talvez a mais divertida: a da geladeira. Era um projeto de cozinha integrada, com uma península de pedra que delimitava o espaço. Originalmente, íamos demolir uma parede para ampliar o acesso, o que permitiria a passagem da geladeira com folga.

No meio da obra, a cliente decidiu manter a parede. Ela até perguntou se isso traria algum problema. Conferimos por alto e dissemos que não — afinal, parecia apenas uma questão estética. O que não percebemos é que, ao manter a parede, o vão de passagem da cozinha ficaria menor que a profundidade da geladeira.

Meses depois, obra finalizada, marcenaria impecável, tudo instalado. Chega o grande dia da entrega da geladeira. A transportadora tenta entrar… e não passa. Simples assim: a geladeira não cabia na cozinha.

A solução foi arrancar a porta da geladeira para conseguir entrar com ela de lado, bem apertada. Deu certo, mas foi tenso. Ficou como piada interna até hoje. E o aprendizado é simples: nunca aprove uma alteração sem revisar o impacto total nas medidas. O cliente pode até mudar de ideia — mas o projeto precisa ser revalidado toda vez.

8. A cuba de apoio que virou dor de cabeça

Essa história é o retrato perfeito de como pequenas mudanças podem gerar grandes confusões. Em um dos banheiros de um apartamento, o cliente pediu uma cuba de apoio, aquela que fica sobre a bancada. Nesse caso, a altura da pedra precisa ser mais baixa, e não dá para fazer aquele complemento de pedra sobre o vaso sanitário, porque atrapalha o acionamento da descarga.

Explicamos tudo isso no 3D e no projeto. Mas, durante a obra, a cliente mudou de ideia e quis a cuba esculpida. Ajustamos o projeto, subimos a bancada, incluímos o complemento de pedra. Tudo certo. Até que, perto da instalação, ela resolveu voltar para a cuba de apoio — e avisou diretamente a marmoraria, sem falar conosco.

O resultado: a pedra foi instalada alta demais, com o complemento sobre o vaso. Ficou impossível dar descarga. A marmoraria cobrou para refazer, a cliente ficou chateada, e nós ficamos no meio. Foi um sábado inteiro resolvendo isso por telefone.

Essa história nos ensinou algo que repetimos até hoje: toda mudança precisa passar pela equipe técnica. Nenhuma decisão de obra é pequena demais para não ser revisada. E, principalmente, não se decide nada de cabeça — precisa abrir o projeto, conferir, validar e registrar.

O que aprendemos com todos esses perrengues

No fim das contas, todos esses perrengues têm algo em comum: eles nasceram de falhas de comunicação, falta de conferência ou excesso de confiança no automático. Coisas simples que poderiam ter sido evitadas com um olhar mais atento.

Mas também aprendemos que, em obra, o erro é inevitável — o que importa é como você reage a ele. Ter calma, assumir responsabilidade e resolver o problema é o que faz diferença. O cliente pode até ficar bravo na hora, mas o profissionalismo no pós-problema é o que fideliza.

Dicas que tiramos de todos esses episódios

  • Confirme medidas e decisões por escrito — nada de “de cabeça”.

  • Tenha revisões cruzadas entre membros da equipe.

  • Crie protocolos de aprovação de material, planilha e layout.

  • Explique ao cliente os impactos de cada mudança antes de autorizar.

  • Valorize o relacionamento com fornecedores — eles podem te salvar em um imprevisto.

Ah, e o mais importante: mantenha o bom humor. No calor do perrengue, dá vontade de arrancar os cabelos, mas meses depois tudo vira história — e aprendizado.

Conclusão

Ser arquiteto é, entre outras coisas, aprender a lidar com o imprevisível. Cada obra é um organismo vivo, cheio de variáveis, pessoas envolvidas e decisões rápidas. O segredo está em transformar cada perrengue em melhoria de processo.

Hoje, depois de tantas histórias — de água, espelho, cortina, argamassa e geladeira — temos uma certeza: profissionalismo não é nunca errar, é saber resolver quando o erro acontece. E com o tempo, os erros ficam menores, o controle maior e as risadas, inevitáveis.